44 – A ordem visual além da poluição visual.

Cada município brasileiro possui, ou deveria possuir, seu respectivo Código de Posturas. Aprovados por leis municipais, esses códigos cuidam da organização e da utilização de espaços públicos. A abrangência dessa expressão “espaços públicos” é passível de refinamentos. “Locais públicos”, “logradouros públicos”, “próprios públicos” são expressões, em certa medida, análogas.

O licenciamento prévio à instalação de outdoors em imóveis particulares exemplifica um aspecto da organização desses espaços, pois a visibilidade desses outdoors, engenhos de publicidade, não fica limitada ao interior desses imóveis particulares. A localização e o tamanho são exemplos de características desses engenhos a serem previamente observadas a fim de não haver poluição visual. Igualmente, convém observar se são luminosos ou não, se são próximos entre si ou distantes e se são prejudiciais à visibilidade de bens paisagísticos e/ou tombados. Outras características e circunstâncias podem se fazer pertinentes conforme especificidades locais, embora não sejam elencadas no presente texto.

Em metrópoles conurbadas no Brasil, cada munícipio cuida, ao seu modo, da poluição visual. Funcionalmente, tem-se uma cidade. Administrativamente, há várias. Não afirmo que a segmentação administrativa fomenta a poluição. Reconheço, porém, que é possível perceber diferenças nas várias paisagens urbanas. Ao longo de uma rodovia que perpassa zonas urbanas de diversos munícipios em Minas Gerais, no Brasil, percebo que os engenhos de publicidade apresentam variações de características, ora muito altos, ora luminosos, ora iluminados durante a noite, ora próximos uns aos outros, ora distantes.

Um engenho de publicidade quer ser visto. Ele fica onde possa ser visto, perto ou longe dos caminhos das pessoas. Ele busca destaque em meio à paisagem. Ele é parte do teor da paisagem. Ele ajuda a compor a ordem visual da cidade, mas, conforme circunstâncias e contextos, contribui para desordens e poluições visuais.

Jacobs (1961, p. 415-435) dedica um capítulo ao debate das potencialidades e das limitações da ordem visual nas cidades. Explicitando que “é preciso ter compreensão para ver os complexos sistemas de ordem funcional como ordem, e não como caos” (JACOBS, 1961, p. 419), essa autora distingue a ordem visual das cidades da ordem funcional e sustenta que não é necessário que planejadores urbanos “tenham um controle literal sobre todo um campo de visão para dar ordem visual às cidades” (JACOBS, 1961, p. 421). Notadamente, essa autora considera que a ordem visual deve trazer suporte à ordem funcional, a qual depende de intensidade e de diversidades de usos.

Ainda que a poluição visual não cause doenças e incômodos como a poluição sonora, a poluição do ar, a poluição de corpos d’água etc., ela deve ser evitada e/ou minimizada. Entre subestimá-la e superestimá-la, há ampla diversidade de nuances. Sistemas de ordem visual, caóticos segundo alguns e ordenadamente complexos segundo outros, podem ser limitados sem rigores plenos. Esses sistemas não têm vigência absoluta nem universal, o que é relevante e, mesmo, necessário. Ordens funcionais evoluem, ordens visuais também.


Referências bibliográficas:

JACOBS, J.. Morte e vida de grandes cidades. 1. ed., 1961. Trad. Carlos S. M. Rosa. São Paulo: Martins Fontes, 2000. 499 p. Título original em inglês: The Death em Life of Great Ameriacans Cities.

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