30 – Distinção entre o poder aquisitivo (ou poder de aquisição de bens), o poder de acumulação de capital e a riqueza pecuniária/patrimonial.

Em vista de leituras das obras literárias de Sen (1992), Harvey (2001), Rocha (2003) e Chang (2013), percebo que são distintos a riqueza de uma pessoa, o poder aquisitivo (ou poder de aquisição de bens) dessa pessoa e o poder de acumulação, por parte dessa pessoa, de capital.

O termo “riqueza” é passível de debates. Além da riqueza financeira, pode-se conversar sobre demais riquezas: riqueza de saúde; riqueza de afeto e amor, riqueza espiritual etc.. Em certa ocasião, escutei de um arquiteto-urbanista a seguinte afirmação: “a riqueza ocorre quando você não precisa trabalhar para manter seu padrão de vida”. Observo que essa riqueza depende de circunstâncias pessoais, locais, regionais, culturais.

Entendo que o poder aquisitivo (ou poder de aquisição de bens) possui relação com a capacidade financeira de suportar compras e gastos. Em linguajar simplista, “ter muito dinheiro pode significar ter grande poder aquisitivo”. Complemento, porém, que o acesso ao crédito financeiro amplia momentaneamente o poder aquisitivo e, posteriormente, tende a comprometê-lo. Em curto prazo, pode-se comprar mais, porém, num médio ou num longo prazo, têm-se dívidas a serem quitadas.

O poder de acumulação de capital consiste na capacidade de alguém juntar bens financeiros, imobiliários etc., mesmo após gastos financeiros relacionados ao pagamento de contas rotineiras e o pagamento de compras, passeios etc..

Alguém financeiramente rico possui, a princípio, poder aquisitivo expressivo, porém não é certo que possua poder de acumulação de capital tão expressivo quanto o seu momentâneo poder aquisitivo. Ao exercer poder aquisitivo, alguém que possua expressivo poder de acumulação de capital pode, até, deixar de estar financeiramente rico.

Distinguir a riqueza financeira, o que é passível de ser comprado através dessa riqueza e o que ainda fica após as compras permite imaginar que uma finalidade, no âmbito coletivo, da organização do trabalho é a viabilização do necessário, quando necessário, a todas as pessoas.

Entendo que o transporte coletivo, através de subsídios dedicados ao suporte financeiro, e o transporte ativo podem atenuar, em linguajar curto e raso, “a erosão do dinheiro das pessoas”. O aumento do valor de tarifas é percebido de maneira mais severa pelas pessoas cuja renda mensal, em vista de custos de vida, não ocasiona acúmulos pecuniários. Estimo que reduções do valor de tarifas suscitem efeitos em sentido oposto. A gestão desses modos de transporte não vem impulsionar pessoas, a princípio, a “ganharem mais dinheiro”, mas a gastarem menos. Em certa ocasião, escutei de um engenheiro civil a seguinte frase sobre educação financeira: “Não é importante só o que você ganha. É importante, também, o quanto você gasta”. Ainda que óbvia para alguns, considero que essa frase não o seja para outros. Mesmo que óbvia para muitos, é relevante tentar identificar faces dessa frase dentre as dinâmicas urbanas. Reconheço que, além de debates acerca de quantidades de dinheiro ganhas e gastas, têm relevância debates acerca de como ganhar e como gastar dinheiro. Igualmente, reconheço a relevância de estudos e leituras para que debates não sejam a simples alternância de monólogos.

 

Referências bibliográficas:

HARVEY, D.. A Produção Capitalista do Espaço. 1. ed., 2005. Trad. Carlos Szlak. São Paulo. Annablume, 2005. 252 p. Título original em inglês: Spaces of Capital. Towards a critical geography. Edinburgo, Escócia. Edingurgh University Press, 2001.

CHANG, H.. 23 coisas que não nos contaram sobre o Capitalismo. São Paulo, SP: Pensamento-cultrix Ltda., 2013. 368 p.

ROCHA, S.. Pobreza no Brasil: afinal, de que se trata? Rio de Janeiro: Editora FGV, 2003. 244 p.

SEN, A. K.. Desigualdade reexaminada. 1992. Trad. Ricardo Doninelli Mendes. Rio de Janeiro: Record, 2001. 301 p. Publicado originalmente em inglês. Título original em inglês: Inequality reexamined.


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