09 - Percepções sobre elementos construtivos que conformam espaços.

Há diferença entre o que é referente à expressão “sistema construtivo” e o que é referente à expressão “sistema estrutural”. Há elementos construtivos que não integram sistemas estruturais. Desprovidos de responsabilidade estrutural, há elementos construtivos cuja escolha independe, genericamente, do sistema estrutural: portas, janelas, revestimentos de piso, revestimentos de faces internas de paredes, revestimentos de faces externas de paredes etc.. 

A arquitetura vai além da estrutura edilícia. A arquitetura cuida dos espaços conformados por sistemas construtivos e abrange, também, os espaços descobertos. Ching e Eckler (2014, p. 52-54) afirmam que “além dos condicionantes impostos pelas cargas estruturais e pela resistência dos materiais, a construção também tem a capacidade de afetar a maneira como o espaço é percebido”. Dentre as características dos materiais de construção as quais balizam percepções, esses autores elencam a cor, a textura, o peso visual, a opacidade e a refletividade. Em relação aos objetos em que esses materiais se fazem presentes, esses autores observam a relevância da localização e da orientação, pois, a exemplo, variações de iluminação podem ocasionar aparências distintas de um mesmo objeto. A utilização de materiais de construção na arquitetura demanda, assim, conhecimentos além da durabilidade, da rigidez e da elasticidade.

Para Ching e Eckler (2014, p. 97), “a forma do plano de cobertura, (...), é determinada pelo material, pela geometria e pelas proporções de seu sistema estrutural, bem como pela maneira como as cargas são transferidas pelos espaços aos apoios e ao solo”. Entendo que, mesmo que as formas dos telhados decorram dos sistemas estruturais, a conformação de espaços arquitetônicos extrapola áreas simplesmente cobertas. Varandas, balcões e planos verticais envidraçados, fixos ou retráteis, oportunizam percepções opostas ao fechamento hermético e opaco de ambientes, opostas ao enclausuramento de ambientes.

Hertzberger (1991, p. 19) observa que demarcações territoriais e acessos podem ser expressos “pela articulação de forma, material, luz e cor”, de maneira a haver “certo ordenamento do projeto (arquitetônico) como um todo” e ser ocasionado o aumento da “consciência dos moradores e visitantes quanto à composição do edifício, (...)”. Para esse autor, “a escolha de motivos arquitetônicos, sua articulação, forma e material são determinados, em parte, pelo grau de acesso exigido por um espaço”.

Ainda que, num edifício, os elementos estruturais e os demais elementos construtivos tenham sido excelentemente instalados e/ou executados e apresentem ótimo estado de conservação, a qualidade dos espaços conformados por esses elementos pode não ser ótima. Pelo contrário, pode ser ruim. O conforto térmico, o conforto acústico, as condições de iluminação, as condições de circulação e a articulação entre as funções desempenhadas nesse edifício são atributos dos espaços integrantes desse edifício, estando relacionados a esses elementos estruturais/construtivos, mas não dependendo unicamente deles. Elementos construtivos de alta performance não conformam, necessariamente, espaços arquitetônicos de alta performance.

Arquitetura não é uma “engenharia estética”, expressão empregada por Zevi (1984, p. 151) ao discorrer sobre interpretações técnicas de objetos arquitetônicos as quais distinguem a “construção real” da “construção aparente”, ou seja, a “engenharia prática” da “engenharia estética”. Embora seja possível discernir, em edifícios específicos, tratamentos visuais dedicados às fachadas frontais distintos dos tratamentos visuais dedicados à demais fachadas, a arquitetura não fica limitada à discriminação de materiais de construção em vista de critérios estéticos ou, simplistamente, de critérios visuais. Em linguajar coloquial, a arquitetura não se reduz ao serviço de maquiar fachadas frontais de prédios. Conhecimentos acerca de materiais de construção, sistemas construtivos e sistemas estruturais são relevantes para que não haja prática profissional obsoleta. O ordenamento de espaços, em âmbito arquitetônico, depende desses conhecimentos. Através desses conhecimentos, ações simples podem, em conjunto, bastar para que sejam alcançadas soluções arquitetônicas efetivas. 


Referências bibliográficas:

CHING, F. D. K., ECKLER, J. F.. Introdução à arquitetura. 1. ed. 2014. Trad. Alexandre Salvaterra. Porto Alegre: Bookman Editora, 2014. 421 p. Título original em inglês: Introduction to Architecture.

HERTZBERGER, H.. Lições de Arquitetura. 1. ed. 1991. Trad. Eduardo Lima Machado. 3. ed. São Paulo, SP: Martins Fontes, 2015. 272 p. Título original em inglês: Lessons for Students in Architecture.

ZEVI, B.. Saber ver a arquitetura. 1. ed., 1984. Trad. Maria Isabel Gaspar, Gaëtan Martins de Oliveira. 6. ed. São Paulo, SP: Martins Fontes, 2009. 286 p. Título original em italiano: Saper Vedere L’architettura.



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